A Temporada Minas S/A Desenvolvimento e Construção tem hoje o quarto episódio, com Marco Antônio Lage, prefeito de Itabira (MG), nas plataformas de O TEMPO.
Marco Antônio Lage é jornalista, empresário, diretor da Associação de Municípios Mineradores (Amig), vice-presidente da Federação Nacional de Prefeitos e ex-diretor da Fiat. Itabira, cidade onde nasceu o poeta Carlos Drummond de Andrade, fica no chamado Quadrilátero Ferrífero de Minas Gerais e tem mais de 120 mil habitantes.
Com uma arrecadação de R$ 1,2 bilhão registrada no ano passado, Marco Antônio afirma que a cidade “tem que virar a chave, fazer a transição” na economia.
“É que 82% da economia de Itabira é suportada pela mineração por uma única empresa, direta e indiretamente, naturalmente”, calcula.
O prefeito de Itabira se refere à atividade da mineradora Vale que está em Itabira desde 1942 e, conforme o relatório que a Vale distribui na NYSE, a Bolsa de Nova York, dá conta da exaustão mineral do território de Itabira, das minas de Itabira, em 2041. Ou seja, o prefeito de Itabira está numa cruzada para diversificar a economia da cidade.
“O minério de Itabira, num primeiro momento, serviu à indústria bélica internacional, e a partir daí, de 1942 até hoje são 82 anos de Vale, o aniversário da Vale foi em julho agora, recente, e que nesse nesses anos todos, nessas décadas, são mais de 2,5 bilhões de toneladas de minério de ferro extraídas de Itabira e exportadas para o mundo. Ou seja, Itabira ajudou na industrialização de Minas, do Brasil, do mundo, então essa é a realidade”, explicou Marco Antônio.
Ele contou que Itabira tem suas vocações como a agroindústria, a agropecuária. “Itabira já foi um dos maiores produtores de banana”, lembrou-se.
“A gente tem que entender, dentro da modernidade também, quais as oportunidades que nós temos para fazer essa transição econômica em tão pouco tempo”, avisou. Por isso, Marco Antônio criou o programa “Itabira Sustentável”, plataforma com 61 projetos, divididos em 15 áreas, com efeitos de curto, médio e longo prazos. A proposta é criar alternativas para mudar o cenário de dependência da mineração.
Nesta entrevista, o prefeito de Itabira falou também sobre programas para o transporte público, a infraestrutura urbana, a inovação, a criação de um Geo Museu, além das atividades culturais e de diversidade na cidade.
A preocupação passa também pela capacitação dos jovens para enfrentar um futuro diferente na cidade. “Hoje tem 3.000 jovens sendo capacitados por conta da Prefeitura de Itabira no Sebrae, no Senai… o Senai tinha 100 alunos, estava moribundo, e agora nós temos 1.000 alunos no Senai. É indústria, comércio, o Senac, o Sesi, todo o sistema S está presente em Itabira hoje, além de um curso de programação digital, de robótica, que está envolvendo mais de 500 alunos e já com empregos, já com alguns sendo empregados remotamente, trabalhando para empresas do mundo inteiro, com aulas de inglês”, comemorou o prefeito de Itabira.
A seguir a entrevista de Marco Antônio Lage na íntegra:
HL: Marco, eu perguntei para o Belini… Belini, gente, foi presidente da Fiat, o Cledorvino Belini, e conviveu muitos anos com você, né, Marco? E aí eu perguntei para ele “Belini, quais são as virtudes que você vê no Marco que são importantes pra perenidade na política?”. Aí ele enumerou 7 itens, aí falou “comunicação, simpatia, dedicação, ele sabe escolher as pessoas da equipe dele, organização, uma visão de Mundo incrível”, aí ele ainda brincou comigo “só tem um defeito” (risos)
ML: Olha só, veja só, Belini.
HL: “Que é ser cruzeirense”. (risos) Mas, gente, não é defeito.
ML: Belini é palmeirense, então ele é palestra também.
HL: Então estamos aí, está todo mundo na luta. Mas essas qualidades são difíceis, não é assim da noite para o dia que a gente vai adquirindo, né, e você teve essa trajetória toda na Fiat com o Belini e com várias outras pessoas, né, é muita gente que fala bem da sua trajetória. O que essas qualidades que o Belini elencou servem na gestão pública, que você usa como prefeito?
ML: É tudo, né, Helenice, porque é claro que a gente vai adquirindo esses atributos no seu percurso profissional, e é claro que os anos de Fiat me mudaram como executivo, como profissional… profissionalmente falando. E a experiência de participar da Diretoria da Fiat, participar do Comitê Diretivo Gestor da Fiat com tantos “craques” que passaram por ali ao longo dos anos, Belini um deles, foi o presidente mais longevo, o tanto que aprendi com a experiência, com a vivência, com a visão de gestão do Belini e de tantos outros que passaram pela Fiat, de tantos outros colegas ali, isso nos traz… foi o que me deu essa bagagem que agora eu estou tendo a oportunidade de aplicar no mundo público, na gestão pública. Agora é a experiência e o desafio de ser o número 1 de uma organização, de uma prefeitura com 3 mil funcionários, e com um nível de responsabilidade de fazer, de promover qualidade de vida para 120 mil pessoas. Então tudo isso, todas essas características que o Belini apontou aí muito gentilmente, elas são fundamentais, elas têm me ajudado a exercer o papel que estou exercendo agora com excelência, seja na criação de processos dentro de uma organização pública, porque o maior problema é a falta de processos, né, na gestão pública.
HL: Previsibilidade, né?
ML: Previsibilidade, é a motivação dos servidores públicos, que são de uma maneira geral muito desmotivados, mal pagos, mal capacitados, sem expectativas de carreira. Então eu trabalhei nisso tudo, mexi nisso tudo ao longo desses 3 anos e meio aí de gestão na Prefeitura de Itabira/MG, e mais do que isso, né, uma visão de planejamento de, sobretudo, médio/longo prazo, que a gestão pública normalmente não tem e é importante isso para as cidades principalmente, é importante isso para a gente dar um passo mais à frente, enxergar um pouco mais à frente, planejar, entender o que que se faz agora, o que se pode fazer dentro do seu mandato de Prefeito, que é meu caso aqui agora, para que a gente possa deixar legados, a gente possa influenciar a cidadania, a sociedade civil, sobretudo, para que haja continuidade de projetos. Eu acredito muito que essas transformações acontecem através das prefeituras.
HL: E, assim, no seu tempo da Fiat ela liderava, no tempo do Belini, foi mais de uma década no 1º lugar, quer dizer, era pressão de tudo quanto é lado, né, do mercado, de acionista, todos tendo que ter resultados. Agora, na gestão pública como é administrar isso? Não dá para, por exemplo, se tem um lado deficitário, reduzir custo, fechar, descontinuar a atuação. Como lidar com as contas públicas e esse limite, essas contingências todas? Como que a conta fecha nisso, Marco?
ML: É diferente um pouco, porque a gestão privada de uma certa forma ela já é muito enxuta, muito eficiente, e naturalmente quando se tem uma crise busca-se cortes e você promove cortes para alcançar suas metas orçamentárias, né, para poder a conta fechar no final do ano. É isso que o acionista espera e exige dos seus executivos. Na gestão pública o que a gente encontra é o seguinte, é claro que é a aplicação da experiência da iniciativa privada na gestão pública é muito interessante, porque existem oportunidade, é você olhar neste ambiente dessa organização e buscar enxergar quais são as oportunidades, e elas existem, é isso que é interessante. Embora você não pode sair cortando, não pode nem demitir os servidores efetivos, eles são estáveis, mas você pode cortar desperdício, e tem muito desperdício na gestão pública.
HL: Dá para fechar muita torneira.
ML: Dá para fechar muita torneira, dá para conscientizar o servidor, dá para mexer nos processos e fazer com que os recursos… você não pode cortar, mas você pode fazê-lo ser mais bem utilizado. Tanto é que a gente tem feito uma gestão em Itabira onde estamos promovendo transformações, mudanças e investimentos em regiões, por exemplo, que eram normalmente periféricas, que eram abandonadas, porque o recurso agora está chegando sem precisar de cortar de outra parte, né.
HL: E cortar de coisas que a população precisa, né, que são essenciais.
ML: Para você promover o impacto maior dos investimentos públicos para a maior parte da população sem ser em detrimento de nenhuma outra área. Então é defender, é cortar desperdícios, principalmente num primeiro momento isso tem sido muito interessante neste modelo de buscar oportunidades.
HL: Dá um exemplo, Marco, de desperdício que você cortou lá em Itabira.
ML: Uma série de desperdícios. Transportes, na parte de transporte público, de logística, né, tinha muito desperdício na parte de logística. Nós tínhamos muitos desperdícios na parte de saúde mesmo, que é um buraco sem fundo, né. Eu lembro quando assumiu o (Antonio) Anastasia, ele comentou “olha, isso aqui é enxugar gelo”, você vai investir, investir…, mas tem possibilidades, você reorganizar as áreas de investimento. Você investe mais na saúde básica, por exemplo, você vai economizar lá na frente no terciário, que não são os hospitais, onde os serviços são mais caros. Então você evita de deixar, você não espera o cidadão adoecer para cuidar dele, você faz a prevenção primeiro. Então a gente fez uma jornada muito forte na gestão da saúde básica, por exemplo, dar atenção primária para poder evitar desperdício em situações de levar ao extremo o paciente para ele poder ser cuidado, né, esse é um exemplo também. Então, logística de transportes escolares, em várias áreas, em todas as áreas nós colocamos um pouco essa visão de corte de desperdício e tem acontecido.
HL: Você está falando de saúde, seu assessor mandou para mim falando que lá nas escolas teve um programa de visão dos alunos, com 10 mil alunos …
ML: De saúde ocular.
HL: De saúde ocular. 500 tiveram que usar óculos, quer dizer, isso lá na frente o problema de saúde que ele ia ter se não tivesse usado óculos…
ML: Existia esse problema de saúde. A gente identificou que havia evasão escolar ou também uma deficiência no desempenho do aluno por problema de visão, ele não estava enxergando o quadro ou tinha dificuldade de fazer o dever de casa. Então nós promovemos o exame de vista em 100% dos alunos, são 10.000 alunos da escola municipal pública, e foram mais, teve uma repescagem depois de 500 e pouco, depois mais 100, ou seja, mais de 600 alunos tiveram que usar óculos, então isso foi gratuitamente, naturalmente, são todos na sua grande maioria de baixa renda.
HL: Você pensar que a pessoa não estava estudando, porque não enxergava, né, quer dizer, o reflexo disso na cidade.
ML: E crianças, né? A gente fala da Escola Municipal, que é a da primeira infância até o Ensino Fundamental I, né, então são crianças que às vezes elas próprias não detectam ou as famílias não detectavam o problema, então isso foi essencial, isso também foi um efeito, um impacto muito positivo para a educação, entre outras coisas na educação que nós estamos fazendo para transformar a cidade numa cidade educadora, uma cidade educativa, que é fundamental para quando se fala em futuro.
HL: Eu quero falar agora um pouco, Marco, sobre a questão da economia. A gente tem Itabira que é uma cidade que a Vale começou lá em 1942, quer dizer, a gente estava conversando aqui antes do programa, é a primeira cidade, no Brasil, da mineração, tudo começou lá. Como que você está lidando com esse legado? Que tipo de legado que é a cidade precisa ter, né? A Vale é uma benção ou é uma maldição, é um benefício? Qual é a situação aí da exaustão da mineração em Itabira?
ML: Itabira é um excelente exemplo para discutir a mineração no país, não só em Minas, mas no país, porque é exatamente a discussão dos legados da mineração. E é uma discussão que vem sendo mais frequente depois dos desastres de Mariana/MG e Brumadinho/MG, né, a questão das barragens. Mas muito mais do que o tema das barragens é esse tema da exploração mineral em um território e que transforma um território, e é preciso falar dos legados da mineração, né, porque são riquezas que são extraídas de um determinado território e que são transportadas para fora do Brasil. Infelizmente o Brasil não beneficia como deveria beneficiar a sua matéria prima, né, nós exportamos pouco valor agregado, o minério é um exemplo clássico disso há tantos anos, desde os primórdios, e Itabira é um excelente exemplo da discussão. A gente discute muito na AMIG, na Associação dos Municípios Mineradores, da qual eu faço parte, sou diretor, junto com o nosso querido prefeito Zé Fernando, que é o presidente, e todos os prefeitos ali das cidades mineradoras do Brasil hoje, inclusive, e a gente, Itabira, é um emblema da mineração no país. Como você disse, a Vale foi criada em 1942, essa história é bacana, porque ela remete a criação da Vale pelo governo Getúlio Vargas, né, que comprou os ativos da recipiente Mineradora Itabira Iron, que era do Percival Farquhar, naqueles idos de 1942 exatamente para explorar a primeira grande mina de minério e hematita a céu aberto do país para responder e atender uma demanda do mundo da Indústria Bélica que precisava de mais minério, né, para a Segunda Guerra Mundial. Então o minério de Itabira, num primeiro momento, serviu a Indústria Bélica Internacional, e a partir daí, de 1942 até hoje são 82 anos, né, de Vale, o aniversário da Vale foi em julho agora, recente, e que nesse nesses anos todos, nessas décadas, são mais de 2 bilhões e meio de toneladas de minério de ferro extraídas de Itabira e exportadas para o mundo. Ou seja, Itabira ajudou na industrialização de Minas, do Brasil, do Mundo, da Alemanha, então essa é a realidade.
HL: Tem minério de Minas Gerais em toda parte.
ML: Em toda parte. Então é importante discutir legados, e quando eu digo que Itabira é emblemática, e ela é um exemplo que precisa ser seguido, de ser estudado a partir de agora, é exatamente porque as cidades mineradoras precisam de se desenvolver e desenvolver outras vertentes econômicas ao longo da vida ativa da mineração para que quando haja exaustão mineral, quando ela acontecer, e ela não dá duas safras, como dizia o ex-presidente Arthur Bernardes, né, minério dá uma safra apenas, quando isso acontecer o território, como aquela comunidade, aquele município, ele tem que estar preparado para a sobrevivência e para a sustentabilidade daquela comunidade. Então essa é uma discussão fundamental no Brasil atual.
HL: E em Itabira as atividades da Vale vão até 2041?
ML: 2041 conforme o relatório que a Vale distribui na NYSE, na bolsa de Nova Iorque, e ela vai atualizando isso. Então a última atualização dá conta da exaustão mineral do território de Itabira, das minas de Itabira, em 2041. Ou seja, sinal amarelo, quase vermelho.
HL: É, não tem nem duas décadas aí para a cidade virar a chave.
ML: Tem que virar a chave, fazer a transição, e o que é mais grave, Helenice, é que ainda hoje nós vivemos a economia… 82% da economia de Itabira é suportada pela mineração por uma única empresa, direta e indiretamente, naturalmente.
HL: Porque tem a cadeia de fornecedores, tem o comércio, né, os salários dos funcionários, 8 mil pessoas em Itabira trabalham na Vale.
ML: Tudo gira em torno do dinheiro da Vale.
HL: Quer dizer, a arrecadação dela com CFEM… dessa arrecadação aí de 1 bilhão e 300, né, que é a arrecadação do município.
HL: Porque tem a cadeia de fornecedores, tem o comércio, né, os salários dos funcionários, 8 mil pessoas em Itabira trabalham na Vale.
ML: Tudo gira em torno do dinheiro da Vale.
HL: Quer dizer, a arrecadação dela com CFEM… dessa arrecadação aí de 1 bilhão e 300, né, que é a arrecadação do município.
ML: R$ 1,2 bilhão, depende.
HL: Depende, né. Nesse ano passado foi de quanto?
ML: R$ 1,2 bilhão
HL: R$ 1,2 em 2023. Qual que é a contribuição da Vale?
ML: Da Vale é diretamente 2/3, mas indiretamente é o resto, 82% digamos, chega a 82%. Só a CFEM é um quarto de toda a arrecadação do município.
HL: Que é o imposto da mineração?
ML: Basicamente
HL: E como está sendo feito isso, Marco? Com a Vale e as ações da Prefeitura, o que você pensa para capacitar o pessoal para saber trabalhar em outras atividades, criar outras atividades econômicas no município, sejam elas na agricultura, na agropecuária, ou em uma outra indústria? Como faz para essa realidade de Itabira mudar?
ML: Itabira tem suas vocações, né, umas mais históricas, como a agroindústria, a agropecuária. Itabira já foi um dos maiores produtores de banana, a região rural de Itabira, do estado de Minas Gerais no passado, por exemplo. Nós tivemos fábricas têxtil de tecido, duas grandes fábricas naquele tempo. Então Itabira é uma cidade com mais de 300 anos de história, né, dos seus primeiros arruamentos ali é uma cidade histórica também, mas é claro que é a luz disso a gente tem que entender, dentro da modernidade também, quais as oportunidades que nós temos para fazer essa transição econômica em tão pouco tempo. É claro que Itabira precisa de se projetar para o Brasil, para o estado e para o Brasil, e preciso do apoio de todos. Quando a gente diz que Itabira ajudou na industrialização de Minas e do país, é preciso que os governos Estadual e Federal lancem um olhar especial sobre essa cidade que deu tanto pro país e que pode ser um case se nada for feito, um case de um outro desastre, eu costumo fazer essa analogia. Não o desastre de uma barragem que se rompe, dramático como foi, como nós assistimos na TV, né, mas um desastre de gestão, desastre da condução de um território tão rico e que se empobrece e se esvazia. Isso vai ser colocado na conta dos governos, da elite, da própria Vale, né, das lideranças que conduzem, não só a cidade, mas que conduzem o nosso estado e o nosso país, deixar que isso aconteça, porque isso é também um péssimo exemplo de como a mineração pode atuar, e a mineração que tem os seus valores fundamentais, né.
HL: Tudo aqui tem minério. Se a gente for olhar esse estúdio aqui todo ele tem.
ML: O nosso celular se não fosse o minério de ferro não existia, né, os equipamentos tecnológicos. Então isso é a grande propaganda da indústria de mineração, mas é real, é a verdade.
HL: A gente não está aqui também pra vilanizar.
ML: Não tem que vilanizar, porque nós estamos nessa…
HL: A gente depende também da mineração
ML: Nós estamos no século XXI, a gente depende da mineração. O mundo se modernizou e utiliza todos os materiais, não é? O desenvolvimento parte por aí. Então, só que nós precisamos falar de sustentabilidade com S maiúsculo, nós precisamos encarar que a mineração sustentável, embora pode ser um paradoxo, que ela não existe, ou é mineração ou é sustentável, mas é preciso que os territórios minerados sejam bem cuidados, que eles sejam olhados com um rigor humano, mais humano, e quais os legados que isso deve deixar. E é esse apelo que eu sempre tenho feito em Brasília/DF, aqui no governo do Estado, diante das lideranças comunitárias do nosso Município, diante de outras lideranças do nosso Estado, industriais, empresariais, envolver a todos num exemplo que a gente precisa dar, sobretudo Itabira, que tem tão pouco tempo, porque o dever de casa não foi feito. Como dizia o Churchill, né, como ele recomendava “faça o mais difícil no momento mais fácil”. Então no momento da abundância você tem que procurar fazer aquilo que é mais difícil na sua vida, e é só a mesma coisa na gestão pública, você teria que fazer o mais difícil que é diversificar a economia, e Itabira precisa disso agora. Itabira precisa de ser olhada com essa escolha, Minas Gerais precisa ver Itabira com a escolha seguinte: essa cidade, que é o nono PIB do Estado, não pode cair em decadência.
HL: Ela não pode virar uma cidade fantasma, né?
ML: Não pode virar uma cidade fantasma como aconteceu com Caeté/MG no passado, como aconteceu com Nova Lima/MG no passado, que se reinventou muito principalmente por conta do mercado imobiliário e pela proximidade com a capital, mas é isso que a gente precisa fazer. Então essa é a busca nesse momento e nós propusemos a Vale, e foi muito bem aceito, diga-se de passagem.
HL: Isso que eu ia te perguntar. Qual é o entendimento dela? O que ela está fazendo pela cidade?
ML: Nós propusemos à Vale exatamente criar um projeto, um planejamento estratégico de curto, médio e longo prazo, sendo que o curto prazo o Prefeito faria, que é cuidar desse eixo humano, porque não existe desenvolvimento econômico, não existe diversificação, não existirá diversificação econômica, transição econômica nenhuma, seria uma falácia, se a gente não cuidar das pessoas.
HL: Se não tiver capacitação, se não tiver mão de obra preparada.
ML: Se não tiver capacitação, se não tiver uma boa educação na cidade, se não tiver uma boa saúde pública, se não tiver uma estrutura, uma infraestrutura na cidade, né. Eu fui de empresa grande, da Fiat durante tantos anos, e participei das decisões de investimentos importantes da Fiat no Brasil e é claro que os acionistas vão colocar o dinheiro aonde, né? Qualquer investidor vai colocar o dinheiro aonde? Num ambiente adequado, e esse ambiente conta o social também, o social é fundamental, as pessoas têm que ser bem-educadas. Eu não vou colocar o meu dinheiro… o acionista não vai investir num novo empreendimento se o ambiente for hostil.
HL: Tem que ter estrada, tem que ter internacionalização, os meninos têm que saber falar inglês. Agora, em Nova Lima, o Prefeito falou que já está tendo aula até de mandarim para ter essa preparação, quer dizer, tem que ter universidades.
ML: Tem que ter aeroporto, tem que ter estrutura viária.
HL: Asfalto, né, porque estrada de terra não dá.
ML: Exatamente.
HL: Agora, a Vale está participando com recursos nessas obras?
ML: Está. Nós criamos em abril de 2021, logo no início do nosso governo, ainda em plena pandemia, que foi o grande desafio do primeiro ano, mas já naquele momento, aproveitando a visita do presidente da Vale à Itabira, tivemos uma reunião maravilhosa de mais de 1 hora de duração, onde nós propusemos pra ele exatamente criar um programa de sustentabilidade chamado “Itabira Sustentável”. Eu já tinha isso na minha cabeça, né, exatamente para que pudéssemos desenvolver um planejamento estratégico para uma transição rápida para uma nova economia em Itabira, para uma nova Itabira pós mineração. Então isso está acontecendo, imediatamente a Vale se dispôs a contratar uma consultoria internacional, nós precisávamos disso, a Prefeitura não tem braço…
HL: E é caro também, né, fazer uma pesquisa, um projeto?
ML: Uma pesquisa, uma programação dessa é cara e precisa de especialistas. A Prefeitura não tinha e nem a Vale se ocupa disso. Então foi contratada a Arcades, que é uma consultoria holandesa que está conosco ainda hoje, desde outubro esse processo de contratação, então desde outubro de 2021, quando foi no segundo semestre do ano passado, quer dizer, 2 anos depois, nós divulgamos para toda a sociedade o plano “Itabira Sustentável”, que já vinha tendo a participação da sociedade civil. É um plano dividido em 15 eixos estratégicos, com a sociedade civil participando ativamente, e ali deu origem a 61 projetos que são transformadores para que Itabira possa fazer essa transição econômica com investimentos substanciais que partem da Vale, naturalmente, é o principal investidor, mas que também a Prefeitura tem suas responsabilidades, uma vez que ela retém receita. Também há outros fundings, outras fontes de receita que nós vamos buscar, seja junto ao Governo Estadual, ao Governo Federal, ao BNDS, seja a fundos internacionais, para que a gente possa compor esse arcabouço de investimentos estruturantes e que sempre, Helenice, possam nos levar para aquele lugar, é o que eu propus ao presidente da Vale. Jamais nós vamos exigir recursos da Vale que não nos leve para esse lugar de uma nova economia para Itabira. Então todo investimento tem que mexer nesse ponteiro e tem que fazer cumprir esse percurso para uma nova economia.
HL: Qual é o valor desse projeto, Marco? Vocês já têm assim delineado?
ML: É um valor estimado perto de 6 ou 7 bilhões, o que não é muito, se pensar num município que contribuiu já com mais de 2,5 bilhões de toneladas.
HL: Em 82 anos, né.
ML: E de 1942 a 1968 não haviam impostos, a cidade não recebeu nada e depois dessa data teve o IM, o imposto da mineração, que também era mínimo e depois que veio a CFEM, quer dizer, historicamente existe um débito com o município.
HL: Sim. Esse é o valor que a Vale vai entrar? R$ 6 bilhões a R$ 7 bilhões?
ML: Isso vai ser definido por projeto. A governança foi definida sim, nós criamos um comitê representativo da sociedade civil, até porque esse é um projeto que não é do prefeito, não pode ficar na prefeitura, é um projeto que independente do prefeito que estiver ali é um projeto que tem que ter continuidade. Então tem hoje o Prefeito, como isso foi criado no nosso mandato, eu sou o presidente do comitê, o Diretor da Vale é vice-presidente desse comitê, e os membros são da sociedade civil, empresários das principais empresas da cidade, lideranças sindicais, lideranças comunitárias, a academia, então tem uma representatividade, as lideranças empresariais, as associações empresariais.
HL: E ele vai até quando, esse projeto? É até 2041? Enquanto a Vale estiver em Itabira?
ML: Pelo menos. Ele não tem data para terminar, ele teve para começar e tem um processo, religiosamente todos os meses têm uma reunião de decisões, de fazer escolhas sobretudo para os projetos prioritários, e qual vai ser o investimento necessário e de onde virá esse investimento.
HL: Isso já está acontecendo, por exemplo, asfaltamentos, é a Faculdade de Medicina, a Universidade?
ML: São vários eixos, né. A Faculdade de Medicina é um dos primeiros produtos dessa plataforma aí que já é real, né. Então nós trabalhamos junto a Brasília, tivemos um apoio muito importante do Senador Rodrigo Pacheco e de Deputados para que a gente pudesse aprovar a Faculdade de Medicina, então a parte política, uma parte jurídica também foi importante para garantir a aprovação junto ao Ministério da Educação, e a Vale fez o investimento nos laboratórios, R$ 30 milhões aprovados para esse projeto para os laboratórios de excelência. Então hoje Itabira tem uma das faculdades de medicina mais bem equipadas do Brasil. Contratamos como consultoria, o know-how, da Feluma das Ciências Médicas, o Doutor Wagner, que é o Presidente da Feluma, abraçou esse projeto de maneira espetacular e trouxe todo o know-how, todo conhecimento das ciências médicas. Então nós conseguimos criar em pouco tempo uma Faculdade de Medicina de excelência em Itabira, né, e tem que ser assim, tem que ser de qualidade para que seja perene. E com isso, por exemplo, com a Faculdade de Medicina, hoje já temos mais de 100 alunos lá estudando Medicina, aí com isso nós podemos projetar uma outra vertente econômica que é um polo médico para Itabira, seja transformando Itabira no macro polo da Medicina e da Saúde Pública, do SUS, desafogando Belo Horizonte, porque ela vai poder ser responsável, assistir sanitariamente, perto de 1 milhão de pessoas daquela região inteira, então isso cria um fluxo de negócios…
HL: É outra cadeia de fornecedores também, na Saúde.
ML: É uma outra cadeia da Saúde que você vai consolidando ali além dos negócios. Vamos inaugurar agora, no segundo semestre, um Centro de Radioterapia completando todo o tratamento oncológico na cidade, então isso tudo vai evoluir, sobretudo, nesta medicina da auto complexidade, né, e vamos ter aquilo que falta hoje no Brasil inteiro para suportar os investimentos médicos, que é a mão de obra, que são os médicos, e uma faculdade de qualidade vai ser fundamental para isso.
HL: Que está formando esse pessoal todo.
ML: E ao mesmo tempo o polo universitário vai se fortalecendo também para que tenha outra vertente econômica, que é ser um polo universitário. Então são serviços que não trazem as mesmas receitas da mineração, mas a princípio já garantem empregos, já garantem renda para a comunidade, então já vai garantindo de maneira rápida assim como o turismo, né, o turismo literário do Carlos Drummond de Andrade como nosso grande anfitrião, turismo da cultura, o turismo ecológico, nós temos uma região rural maravilhosa, que são verdadeiros santuários, dos distritos de Senhora do Carmo e Poema, Ribeirão São José, nós temos uma região rural belíssima que tem que ser melhor explorada, já está sendo, né, pelo turismo, além de, na região rural, todas as oportunidades do agro se fortalecer com mil quilômetros quadrados de região rural de terra fértil.
HL: Que dá para plantar, dá para criar.
ML: Dá muito, porque a mineração absorve muito ao longo dos anos todas as outras atividades econômicas. Agora é o momento de fazer o caminho de volta, só que tem que fazer rápido.
HL: E vocês estão fazendo isso? Capacitando as pessoas, oferecendo cursos, fazendo parcerias com o Sistema S?
ML: Para todas essas vertentes econômicas. Nós encontramos em 2021 uma juventude muito desanimada, muito desesperançosa com relação ao futuro, porque ao longo de 8 décadas as famílias todas preparavam seus filhos para trabalhar na Vale.
HL: Era geração em geração, né, não precisava nem pensar.
ML: Geração em geração, era natural que isso acontecesse, o modus operandi, era muito natural, era cultural na cidade. Os filhos eram preparados para fazer o Senai e trabalhar na Vale, sempre foi assim. E diante dessa nova perspectiva de exaustão há um medo, inclusive na cidade, uma desesperança, os jovens se perdendo, essa é a realidade, então estamos investindo muito. Hoje tem 3 mil jovens sendo capacitados por conta da Prefeitura no Sebrae, no Senai… o Senai tinha 100 alunos, estava moribundo, e agora nós temos 1000 alunos no Senai. É Indústria, Comércio, o Senac, Sesi, todo o sistema S está presente lá hoje, além de um curso de programação digital, de robótica, que está envolvendo mais de 500 alunos e já com empregos, já com alguns sendo empregados remotamente, trabalhando para empresas do mundo inteiro, com aulas de inglês.
HL: Vocês estando dando também nas escolas?
ML: Totalmente, para que a gente prepare uma grande revolução na Educação Básica também. Nós reformamos 100% das escolas, dotamos a escola de uma virada pedagógica, valorização do professor, naturalmente, do profissional do ensino, isso é básico, né, mas também investimentos em robótica, em laboratórios de ciência, exatamente para adotar nas escolas um modelo de ensino que possa preparar esses meninos, esses jovens, para um futuro diferente na cidade.
HL: E que o mercado vai absorver.
ML: Que o mercado vai absorver e que vai nos ajudar a atrair as empresas, por maior que invistam em tecnologia, elas precisam ali de pessoas capacitadas e que aprendam fácil, né, que tenham capacidade de aprendizado. A gente viveu isso muito também no mundo corporativo e isso é um diferencial. Então estamos preparando Itabira para essa nova realidade aí.
HL: Marco, você falou um pouquinho aí de Carlos Drummond, é um legado também, é uma figura que viveu lá 18 anos, né, pessoal, teve uma época que tinha uma rixa por um poema dele, uma frase que tiraram do contexto: “Itabira é só mais uma fotografia na parede”.
ML: “Mas como dói”.
HL: “Mas como dói”, exatamente. Já fizeram as pazes? O itabirano já fez as pazes com Carlos Drummond? Já tem um legado, já tem um monumento histórico todo voltado para ele?
ML: Já tinham. O que mais tem em Itabira é estátua do Carlos Drummond de Andrade, mas mais do que as estátuas, nós estamos promovendo um reencontro da cidade com o poeta maior, né. Drummond é naturalmente um poeta publicado em mais de 40 países e um poeta histórico e respeitado no mundo inteiro, no Brasil e no mundo inteiro. Naturalmente isso é um valor para a cidade, né, você tem um filho ilustre da literatura e que nos permite trazer o Drummond de volta para uma nova era, para nos ajudar a transformar Itabira numa cidade da cultura. Itabira já tem uma vocação cultural muito interessante, Itabira tem ali as suas vocações cosmopolitas, apesar de ser uma cidade do interior, e isso tudo nos ajuda nesse momento a promover o turismo literário também, o turismo cultural literário. Nesse momento nós estamos tendo o Quinquagésimo Festival de Inverno, são 50 anos de um Festival de Inverno que é música, literatura, artes plásticas, teatro, oficinas, a cidade pulsa cultura durante três semanas no mês de julho, isso há 50 anos que é um produto de Itabira. E o que nós fizemos? Nós potencializamos este produto que é itabirâmico, é o Festival de Inverno. Criamos o Festival Literário, o Festival Internacional Literário, o Flitabira, com o nosso querido Afonso Borges, que é um craque na Itália, uma referência na promoção da literatura já no Brasil todo, ele criou vários festivais, e felizmente ele veio para Itabira, um colega nosso desde faculdade, promover o Flitabira e é um sucesso também. Nós temos recebido exatamente na última semana de outubro, que é a semana de aniversário do Drummond, tem sido a cada ano, o primeiro ano foi online por conta da pandemia, e isso vai projetando Itabira para fora, para o Brasil e para o mundo, para promoção de um turismo literário. Então o turismo é uma das vertentes econômicas nesse sentido, né. E o Drummond…
HL: Tem a casa dele, tem fazenda, tem tudo lá (Itabira) conservado.
ML: E que estão sendo revitalizados. O Memorial Carlos Drummond de Andrade, projeto do Niemeyer, e que nós trouxemos, além de uma biblioteca maravilhosa que a família nos doou, o próprio Drummond doou em vida, de livros pessoais do Drummond, é uma biblioteca raríssima que tem ali para visitação, nós criamos uma exposição chamada “Drummond Vida em Obra”, uma exposição permanente com curadoria do neto do Drummond, querido Pedro Augusto, que cuida de todo esse acervo, de toda a obra do Drummond, e é uma exposição maravilhosa que os estudantes estão adorando, os visitantes, os turistas, porque conta a vida e obra do Drummond de uma maneira mais lúdica também.
HL: Falam que tem os bonecos, né?
ML: É, o Agnaldo Pinho, que é um discípulo do Álvaro Apocalypse, do Giramundo, né, ele criou de maneira magistral essa exposição onde o Drummond conta em sua própria voz através dos seus poemas e numa animação entre bonecos, então são vários drummonds, drummozinhos em boneco ali, então é uma exposição maravilhosa, divertida, encantadora. Tem o Memorial, tem a casa do Drummond que está sendo totalmente revitalizada agora, do ponto de vista também museográfico, então nós estamos cuidando muito da cultura de Itabira, muito desse valor cultural da cidade, né, e não só o Drummond, mas também ampliando esse olhar sobre a cultura da cidade. Nós temos uma tradição da cultura negra muito importante na cidade, 72% da população de Itabira se declara negro, pretos e pardos, e com 2 comunidades Quilombolas… tem mais, mas duas que são completas e que nós estamos trabalhando dentro de um projeto chamado “Cidade Quilombola” para prover essas comunidades de todos os serviços públicos, né, para que elas não se descaracterizem, para que os jovens não se percam, para que eles não tenham que vender suas terras e descaracterizar completamente, o que acontece no Brasil todo, né.
HL: E tem uma grande líder lá, né?
ML: Tem várias lideranças fantásticas, sabedorias maravilhosas, sabedorias históricas, e este ano especialmente, é um projeto de lei do município dedicado ao centenário da dona Tita, que é uma matriarca, uma líder quilombola que está fazendo 100 anos agora em agosto e que é um emblema disso tudo. Ela é uma referência e através dela tamo fazendo um filme de 29 minutos, promovido pela Prefeitura com cineastas, com um pessoal profissional, trabalhando para que a gente através dela possamos contar a história magnífica desses nossos ancestrais vindos da diáspora africana, né. Então Itabira tem tudo isso além do Drummond, né, e uma zona rural maravilhosa paro o turismo ecológico, o turismo rural, como a gente já comentou, e o turismo da mineração, que é um projeto que está nesses 61 projetos com a Vale, do Itabira Sustentável, nós temos também ali desenhado, trabalhado, um projeto que inclusive foi resgatado junto a Eleonora Santa Rosa, que foi ex-Secretária de Cultura daqui de Minas Gerais, que é o projeto do Geo Museu.
HL: Vai ser um novo inhotim?
ML: É diferente.
HL: Tudo a céu aberto, né? A gente vai poder ver uma mina como é que é.
ML: É curioso que o João e a Milena me trouxeram essa ideia quando eu fazia um projeto com ele pela Fiat, ele circulava o Brasil pra falar de mobilidade urbana e no final de semana nós fomos a Itabira e ele viu tudo aquilo e me disse “o Marco, quando você for prefeito dessa cidade…”, eu falei “eu não vou ser prefeito aqui”, mas quando você for, isso tem quase 20 anos, ele disse o seguinte “não deixa maquiar nada disso, transforma isso aqui no maior museu da mineração a céu aberto do mundo”. E é isso que está projetado hoje, nós temos também a oportunidade de ver quem sabe o Pico do Cauê, tão cantado em verso e prosa pelo Drummond, que era um pico que hoje virou uma cava, poder ver isso, assistir isso do alto por teleférico, conhecer as marcas da mineração exatamente como você disse, sem vilanizar ninguém, apenas a gente contando história, a história da mineração no Brasil e a história de Minas Gerais, a história de Itabira, isso seguramente vai atrair turistas no mundo inteiro no futuro. Então são grandes oportunidades que nós estamos mapeando, construindo, isso é para que haja os investimentos, aí sim vai ser o momento de atrair a iniciativa privada, os investidores internacionais, a gente sabe que tem italianos, espanhóis, investidores do mundo inteiro interessados em investir no turismo no Brasil e vai ser o momento de Itabira receber esses investidores estrangeiros não pra explorar o minério, como aconteceu com o Percival Farquhar lá atrás, mas agora com um novo olhar e o investimento no turismo, que é essa indústria maravilhosa, né, tão explorada, bem explorada na Europa e que gera renda, receita, empregos, e que é uma indústria que pode ser o futuro de Itabira também.
HL: É, a gente tem vários exemplos pelo mundo. Vai criar uma poupança? Você já vai começar com esse projeto por agora, é para ter na arrecadação, guardar um tanto ali pro futuro?
ML: Vamos. Acho que essa é uma ideia do nosso governo, não sei se nós vamos ter condições de transformar isso num projeto/lei ainda para este ano em função da ambiência política, ano de eleição, mas a gente tem que deixar pronto o trabalho, né, assim, neste mandato deixar pronto o projeto que é do Fundo Soberano. Itabira passar a ser signatária do Fundo Soberano, que é algo que tem dado certo no mundo inteiro e também no Brasil, já com exemplos muito bacanas das cidades petrolíferas.
HL: Que tem os royalties também e eles guardam né.
ML: O que é uma poupança, é um fundo geracional, é pensar na próxima geração e isso é um sinal de maturidade.
HL: Você está pensando em quê? Qual que é o percentual? Já tem isso ou não, ainda vai ser discutido?
ML: Está sendo estudado, está sendo finalizado esse estudo para gente propor a comunidade, para gente propor a sociedade. Então eu tenho feito um governo que escuta muito a sociedade, as associações comunitárias, as entidades empresariais, sindicais. É uma maturidade, é uma evolução do modelo de gestão que a gente está propondo, né, porque normalmente os prefeitos querem gastar tudo para fazer bonito e pensando sempre na próxima eleição, você investe pensando na próxima eleição, e nós precisamos, sobretudo Itabira, pensar na próxima geração, isso é fundamental. E o Fundo Soberano é uma poupança que você vai juntando, então o que nós estamos projetando é que em 20 anos, e dependendo inclusive da participação da própria Vale na contribuição neste fundo, e colocando ali todos os contenciosos que existem ao longo dos anos que estão nos embates jurídicos entre município e Vale, que vai se prosperando ao longo dos anos, eventualmente colocar tudo isso nessa caixa, tudo isso nesta poupança para gente formar um fundo onde lá no final quando a exaustão chegar, a receita deste fundo possa cobrir os valores do CFEM que nós recebemos hoje.
HL: Consegue fazer uma transição, né?
ML: Fazer essa transição, mas essa é a lógica, né. Como que nós vamos cobrir cada imposto que a cidade recebe hoje para manter o município com qualidade de vida, como é que a gente vai fazer isso? E o CFEM que é um imposto que imediatamente acaba quando acabar a exploração do minério, quando chegar exaustão, como é que nós vamos cobrir isso? Esse fundo, essa poupança que nós vamos criando a partir de agora todos os anos, e o prefeito não pode mexer, esse é um caixa, é uma poupança que não pode colocar a mão pra invejar a não ser que haja uma catástrofe, então as regras vão estar definidas, elas servirão lá pro futuro para os nossos filhos, nossos netos lá na frente para que a gente garanta a sobrevivência da cidade se nada acontecer, mas a gente espera que haja, muito esforço, muita sabedoria, muito engajamento da nossa sociedade e das lideranças municipais, estaduais e federais pra que Itabira seja um case de sucesso no pós mineração, não o contrário.
HL: Vamos falar um pouquinho de política? Marco, a gente já está terminando, mas o que acontece, você é do PSB. Você se considera um socialista e o que isso influencia na política, na decisão de um prefeito?
ML: Eu, sinceramente, é minha é a primeira investida minha no universo da política, eu não tinha nem filiação, e depois o PSB veio através do próprio grupo que eu apoiava em 2020, depois eu resolvi ser prefeito, porque o candidato que eu apoiava desistiu na última hora, eu tinha sido filiado ali momentos… no último dia que eu me filiei, e fui conhecer também um pouco mais do PSB. Gosto das diretrizes do partido, que é um partido histórico, nascido nos ídolos de Pernambuco e até hoje tem uma liderança pernambucana interessante, porque é um partido socialista, mas sem radicalização.
HL: Mas você é socialista, assim, aquele raiz?
ML: Não, eu me considero… tem até um jornalista em Itabira, né, o Carlos Cruz, que é o jornalista que é oriundo do Cometa Itabirano, que é um grande orgulho nosso do jornalismo de Itabira também, o Cometa Itabirano foi um jornal que projetou Itabira para o Brasil inteiro, histórico, e Drummond escrevia para o Cometa, né, especialmente para o Cometa, era muito interessante, mas fechando parênteses, o Carlos até definiu como socialista liberal, que eu acho que é meio estranho falar um pouco disso, mas é, porque o que que é ser socialista? É a gente poder pensar um pouco… isso na minha concepção, tá? É pensar um pouco na distribuição de renda, que a população tenha acesso aos serviços públicos, um olhar exclusivo para os mais necessitados, garantir é os direitos do cidadão, né, todos os direitos ao cidadão, então acho que é todo esse cuidado, cuidar de gente, cuidar das pessoas, principalmente dos mais necessitados
HL: Mas sem perder o pé no mercado também, né?
ML: E aí o liberal é isso. Eu acredito na iniciativa privada, eu venho da iniciativa privada, eu trabalhei tantos anos numa multinacional, de gerar lucro, de crescer mais, e participei dessa história de Fiat de um grande salto de último lugar na Indústria Automobilística para o primeiro lugar, o quanto que nós trabalhamos nessa minha geração de Fiat pra uma liderança, para conquistar mercado, para essa disputa de mercado, briga de foice que ainda que era a Indústria Automobilística, então, quer dizer, eu sou a favor da livre iniciativa, acredito nesse papel do capital, mas ao mesmo tempo é preciso garantir distribuição de renda. Eu acho que o capitalismo está falido cada vez mais enquanto houver fome no mundo. Então, eu, por exemplo, a primeira coisa que eu me debrucei foi sobre a população de pobreza, extrema pobreza, na minha cidade. Você imagina uma cidade com Itabira, que é o nono PIB do estado de Minas Gerais, mas com 12,6% da população em estado de pobreza, extrema pobreza, é uma discrepância. Então se isso é ser socialista, se ser socialista é cuidar da educação das crianças, é, por exemplo, fazer com que uma cidade que tinha 1300 vagas faltando nas creches, déficit de creche, e nós estamos zerando agora até o final do meu mandato, não vai ter nenhuma criança fora das creches em Itabira, se isso é ser socialista…
HL: Está resolvendo um grande problema.
ML: A gente cuidar da educação, a educação de uma cidade rica que estava pior que mais da metade das cidades de Minas Gerais, segundo a avaliação do Ideb, e a gente fazer um salto na educação pensando nessas famílias, pensando na educação dessas crianças e no futuro dessas famílias, no futuro dessa cidade, acho que isso é ser socialista sim e está bom. Cuidar do saneamento básico numa cidade com 40% de esgoto tratado nós estamos entregando com 80% e tem que chegar a 100%
HL: Não dá para pensar mais numa sociedade sem esgoto
ML: Porque isso é Saúde Pública. Conversa com sanitaristas para ver o impacto para a saúde pública de uma cidade sem esgoto.
HL: E uma cidade com uma arrecadação bilionária.
ML: Bilionária, não pode. Se o transporte público… reduzir o preço de passagem de ônibus como nós fizemos para R$ 3,00, seria mais de R$ 7,00 hoje, subsidiando o transporte público para promover para que as pessoas possam ter acesso aos demais direitos públicos, isso também é importante, quer dizer, esse cuidado. O esporte, hoje, nós temos a Secretaria de Esporte estava fechada em Itabira. Hoje nós temos 4.200 pessoas, a maioria crianças e adolescentes saindo das ruas e praticando esportes nas mais diversas modalidades esportivas por conta da prefeitura, nós construímos um galpão que tinha virado uma “Cracolândia” na cidade, nós desapropriamos e construímos um Centro Olímpico que é um dos 10 melhores do Brasil em Itabirito, isso em 2 anos, né, e está assim, faltam vagas para tantos interessados e para crianças de baixa renda praticarem ginástica olímpica na cidade.
HL: Deu para fazer.
ML: Deu para fazer a proteção dos idosos, nós temos um programa chamado Vida Ativa, hoje tem 1.300 idosos de baixa renda, em sua maioria, mas não é fechado, sendo ativados dentro de programas de esporte, de dança, de lazer, é uma promoção do lazer na cidade, e o idoso chega perto de mim “Prefeito, parei de tomar remédio pra depressão, porque eu estou no Vida Ativa”. Então isso é bacana. Da mesma forma a reforma de todas as praças. Nós estamos reformando 16 praças e com acessibilidade em todas elas, espaço para a criança, espaço para os pets, para que também a cidade tenha vida. Então, assim, se isso é ser socialista, bem-vindo socialismo. Mas acredito na iniciativa privada.
HL: O melhor dos dois mundos, né?
ML: Inclusive fazendo essa simbiose com serviço público. A Casa de Apoio, que eu não comentei, a gente trouxe e reabriu a Casa de Apoio aqui em BH para aqueles pacientes que vem fazer tratamento, principalmente tratamento oncológico, e que passavam o dia todo esperando a van voltar sentados numa cadeira dura, sem um lugar para descansa. Essa Casa de Apoio aqui de BH, hoje, da Prefeitura de Itabira oferece alimentação, leito, banho, humaniza o atendimento. Nós precisamos cuidar de pessoas, eu acho que esse maniqueísmo de direita, esquerda, essa competição…
HL: Essa polarização toda que está no mundo inteiro, né, isso aí não levar a lugar nenhum.
ML: Isso não vai ler a lugar nenhum, acho que nós precisamos de olhar para o outro, isso é fundamental também na atividade política.
HL: Me fala uma coisa, assim, eu sei que você é um grande admirador, praticamente guru seu, né, o Juscelino Kubitschek, você acha que teria sido diferente a história do país se em abril de 1964 Juscelino tivesse se apresentado como coronel médico lá, pegar a farda e ir trabalhar, se apresentar ao Comando Geral na Polícia Militar, que ele era, você acha que teria sido diferente?
ML: Acho. Acho que seria uma visão diferente. Essa é a visão mais humanitária mesmo de progressista, né, de olhar para frente, de um visionário, a gente está falando de um visionário. Eu acho que a história poderia ser diferente e era um período em que os estadistas faziam a diferença sim, não é? Eu acho que a visão, o pensamento, a capacidade de conciliação, a capacidade política de articulação, seguramente a história seria um pouco diferente do nosso país.
HL: Minas tem jeito de pagar essa dívida? Qual seria a solução na sua opinião? Se você tivesse aí com esse poder.
ML: Eu acho que as soluções estão colocadas. Hoje estão colocadas pela proposta do Senador Rodrigo Pacheco, do Governo Federal, o que a gente não pode ficar é empurrando essa solução mais para a frente, porque o Estado precisa de investimentos, precisa evoluir.
HL: Respinga em todos nós.
ML: Respinga. Eu acho que a paralisia às vezes é pior do que uma decisão equivocada. Então eu acho que as propostas que estão sendo colocadas eu preservaria. As empresas públicas estão aí, elas precisam de excelência, elas precisam de qualidade. A Cemig, eu passei por lá também durante um período antes de ir para a prefeitura, então precisa de investimento, exige investimento, são infraestruturas fundamentais, mas independente de em quais mãos estarão essas empresas, por exemplo…
HL: Dá para resolver sem federalizar.
ML: Dá para resolver. A gente não precisa nem federalizar. Eu acho que é uma negociação, boa vontade política, isso já foi feito no passado com outros Estados, mesmo que com dimensões um pouco diferentes, mas Minas é um Estado importantíssimo para a economia, para a nossa sociedade brasileira
HL: Tem um país todo aqui dentro, né.
ML: Tem um país aqui dentro, então é preciso preservar, precisa compor isso de forma inteligente, fazer essa composição, esse acordo da dívida e seguir, porque Minas tem um protagonismo muito fundamental para o desenvolvimento do nosso país
HL: Marco, tem tanta coisa ainda para falar, mas a gente já tem que terminar, menino, olha só como é que passa rápido! 1 hora já.
ML: É, passa muito rápido, mas acho que deu para a gente dar um panorama da realidade de Itabira, que é essa cidade que eu nasci, cidade que amo tanto e que eu estou tendo essa grande oportunidade, um grande orgulho de poder dar uma contribuição para um novo ciclo do nosso município. E visitem Itabira, né.
HL: Nossa, com certeza! Eu conheço e é maravilhosa.
ML: E tem um grande projeto que eu também não comentei aqui, que é um projeto bem robusto de revitalização de todo o centro histórico de Itabira. Isso já tem uma parte de projetos que a CEMIG já desenhou, já executou, é um investimento muito grande, mas a gente está inclusive reunindo com historiadores, arquitetos, moradores do Centro Histórico, exatamente para chegar no modelo ideal de revitalização, de recuperação e de ocupação do Centro Histórico de Itabira. É um outro projeto belíssimo que me motiva tanto
HL: É, que bom! Tem o Distrito Industrial, o novo, que também tá aí e que vai fazer diferença nessa nova fronteira.
ML: Um Eco Distrito, que é um projeto que também está dentro do programa de Itabira Sustentável, né, então tem muita novidade. Acho que Itabira tem jeito e, a cidade, espero tanto que seja um show case de cidade mineradora sustentável.
*Por O Tempo