Um general russo encarregado das forças no sul da Ucrânia foi demitido depois de abordar publicamente os problemas enfrentados pelas suas tropas, em um novo episódio que reflete novas fissuras no comando militar da Rússia após a rebelião do líder mercenário Yevgeny Prigozhin.
O major-general Ivan Popov, comandante do 58.º Exército na região ocupada de Zaporíjia (sul), um ponto essencial na contraofensiva que vem sendo executada pela Ucrânia, disse numa mensagem áudio para as suas tropas, divulgada na noite de quarta-feira (12/07), que foi demitido após uma reunião com o alto comando militar.
Segundo Popov, a liderança militar ficou irritada com o seu discurso franco sobre os desafios enfrentados pelas suas forças, particularmente a falta de equipamento para se contrapor à artilharia inimiga, que vem resultando em elevadas baixas russas.
“Os altos oficiais aparentemente viram-me como uma fonte de ameaça e rapidamente emitiram uma ordem para se livrarem de mim, que foi assinada pelo ministro da Defesa em apenas num dia”, afirmou, ressalvando que, apesar disso, os militares ucranianos falharam tentativas de romper as defesas do exército russo.
“Mas o principal comandante atingiu-nos por trás, decapitando o exército de forma traiçoeira e covarde neste momento tão difícil”, afirmou.
Popov chamou as suas tropas de seus “gladiadores” na mensagem de áudio, divulgada pelo general reformado Andrei Gurulev, que comandou o 58.º Exército no passado e atualmente é deputado. Popov, de 48 anos, ainda encorajou os seus soldados a procurá-lo diretamente se tiverem qualquer problema – uma abordagem descontraída que contrasta fortemente com o estilo formal e rígido de comando dos militares russos.
“Enfrentei uma situação difícil com a alta liderança quando tive de ficar calado e agir como um covarde, dizendo o que eles queriam ouvir, ou chamar as coisas pelos seus nomes”, afirmou Popov.
Num sinal de que alguns membros do governo russo partilham as críticas de Popov à liderança militar, Andrei Turchak, o primeiro vice-presidente da câmara alta do parlamento e chefe do principal partido do Kremlin, o Rússia Unida, apoiou fortemente o general, dizendo que “a Pátria pode ter orgulho nestes comandantes”.
Andrei Kartapolov, um general aposentado que chefia o comitê de defesa na câmara dos deputados, também disse que o Ministério da Defesa deveria lidar com as questões levantadas por Popov.
A notícia da demissão de Popov somou-se ao golpe que as tropas russas receberam quando outro alto oficial, o tenente-general Oleg Tsokov, foi morto na terça-feira num ataque ucraniano.
Os comentários de Popov sobre a necessidade de uma rotação das suas tropas exaustas que lutam na contraofensiva ucraniana desde o início de junho incomodaram o chefe do Estado-Maior, general Valery Gerasimov, que os considerou como um exemplo de pânico e prontamente ordenou sua demissão. Gerasimov e o ministro da Defesa, general Sergei Shoigu, foram justamente os dois principais alvos da rebelião Wagner, que foi desencadeada após acusações de incompetência e traição feitas por Prigozhin contra a liderança militar do país.
Militares presos
Ainda nesta quinta-feira (13/07), uma reportagem do jornal americano Wall Street Journal (WSJ) apontou que vários altos oficiais militares russos, incluindo o general Sergei Surovikin, ex-comandante das forças russas na Ucrânia, foram presos, no âmbito da rebelião do Grupo Wagner.
O general, que comandou as forças russas na Síria e depois na invasão da Ucrânia, foi detido e interrogado, segundo as fontes do jornal, juntando-se a outras altas patentes que foram presas, suspensas ou demitidas.
Surovikin não foi acusado formalmente de nenhum crime, mas é suspeito de que estava a par dos planos de rebelião do líder do grupo mercenário Wagner.
Oficialmente, o Kremlin não confirma a detenção de Surovikin, mas, segundo o WSJ, ela estaria inserida numa campanha do Kremlin para afastar oficiais suspeitos de deslealdade. Junto com o general, indicou o WSJ, pelo menos 13 altos oficiais foram detidos para interrogatório, tendo alguns deles sido libertados posteriormente, e cerca de 15 foram suspensos ou demitidos. Segundo uma das fontes do jornal, o coronel-general Andrey Yudin e o tenente-general Vladimir Alexeyev também foram detidos e a seguir colocados em liberdade, após terem sido suspensos e os seus movimentos restringidos e sob observação.
Entre outras figuras detidas, segundo o jornal, está o ex-coronel general Mikhail Mizintsev, que foi vice-ministro da Defesa, e conhecido como “o carniceiro de Mariupol”, e que ingressou no Grupo Wagner de Prigozhin. Surovikin foi visto pela última vez num vídeo divulgado em 23 de junho, parecendo angustiado, enquanto pedia a Prigozhin e aos seus mercenários para abortarem a sua rebelião.
jps (Lusa, ots)